Legislação Informatizada - LEI Nº 496, DE 1º DE AGOSTO DE 1898 - Publicação Original

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LEI Nº 496, DE 1º DE AGOSTO DE 1898

Define e garante os direitos autoraes

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sancciono a lei seguinte:

     Art. 1º Os direitos de autor de qualquer obra litteraria, scientifica ou artistica consistem na faculdade, que só elle tem, de reproduzir ou autorizar a reproducção do seu trabalho pela publicação, traducção, representação, execução ou de qualquer outro modo. A lei garante estes direitos aos nacionaes e aos estrangeiros residentes no Brazil, nos termos do art. 72 da Constituição, si os autores preencherem as condições do art. 13.

     Art. 2º A expressão « obra litteraria, scientifica ou artistica » comprehende: livros, brochuras e em geral escriptos de qualquer natureza; obras dramaticas, musicaes ou dramatico-musicaes, composições de musica com ou sem palavras; obras de pintura, esculptura, architectura, gravura, lithographia, photographia, illustrações de qualquer especie, cartas, planos e esboços; qualquer producção, em summa, do dominio litterario, scientifico ou artistico.

     Art. 3º O prazo da garantia legal para os direitos enumerados no art. 1º é: 1º. para a faculdade exclusiva de ;azer ou autorisar a reproducção por qualquer fórma, de 50 annos, a partir do dia 1 de janeiro do anno em que se fizer a publicação; 2º, para a faculdade exclusiva de fazer ou autorisar traduções, representações ou execuções, de 10 annos, a contar, para as traducções da mesma data acima prescripta, para as representações e execuções, da primeira que se tiver affectuado com autorisação do autor.

     Art. 4º Os direitos de autor são moveis, cessiveis e transmissiveis no todo ou em parte e passam aos herdeiros, segundo as regras de direito.

      § 1º A cessão entre vivos não valerá por mais de trinta annos, findos os quaes o autor recobrará seus direitos, si ainda existir.

      § 2º Fica sempre salvo ao autor, por occasião de cada nova edição, emendar ou reformar sua obra, ou rehaver seus direitos sobre ella, comtanto que restitua ao cessionario o que delle houver recebido em pagamento, metade do valor liquido da edição anterior.

      § 3º Para execução do paragrapho antecedente, o cessionario deverá declarar por escripto ao autor o numero dos exemplares de cada edição com o respectivo preço e cada tiragem será considerada como uma edição.

      § 4º As declarações do cessionario fazem prova plena contra elle, mas o autor poderá contestal-as sempre que tiver outras a oppôr-lhes.

     Art. 5º A cessão ou herança, quer dos direitos de autor, quer do objecto que materialisa a obra de arte, litteratura ou sciencia, não dá o direito de a modificar, seja para vendel-a, seja para exploral-a por qualquer fórma.

     Art. 6º Na ausencia de contracto de edição, legalmente feito, presume-se sempre que o autor está na inteira posse de seus direitos. Aquelle que sem esse contracto, sejam quaes forem as allegações que fizer, publicar qualquer obra, deve ao autor uma indemnisação nunca inferior a 50 % do valor venal da edição completa.

     Art. 7º Os credores do autor não podem durante a vida delle apprehender os seus direitos; mas tão sómente os rendimentos que dahi lhe possam advir.

     Art. 8º Os proprietarios de uma obra posthuma gosam dos direitos de autor pelos prazos marcados no art. 3º, a contar, porém, para as reproducções e tracducções, do dia 1 de janeiro do anno em que tiver fallecido o autor.

     Art. 9º Quando uma obra feita em collaboração não é susceptivel de ser dividida, os collaboradores, desde que não preceda contracto em opposto, gosam de direitos iguaes, não podendo qualquer delles, sem o consentimento de todos os outros, fazer ou autorisar a sua reproducção. Em caso de desaccordo entre os co-proprietarios, cabe aos Tribunaes decidir, podendo, quando algum delles se opponha á publicação, determinar que elle não participe das despezas, nem dos lucros ou que seu nome não figure na obra. Cada um dos proprietarios póde individual e independentemente fazer valer a sua parte de direitos.

     Art. 10. Nas obras theatraes em que collaborarem diversos autores, basta o consentimento de um delles para sua exhibição ou representação, ficando salvo aos mais o direito de, pelos meios judiciaes, se indemnizarem da parte que lhes tocar.

     Art. 11. O editor de uma obra anonyma ou assignada com pseudonymo tem os onus e direitos do autor. Todos, porém, passarão a este, desde que seja conhecido.

     Art. 12. O autor de uma traducção gosa a respeito della dos mesmos direitos autoraes, não podendo, porém, impedir que se faça da mesma obra outras traducções, salvo durante o prazo do art. 3º, n. 2, si for cessionario desse direito.

     Art. 13. E' formalidade indispensavel para entrar no goso dos direitos de autor o registro da Bibliotheca Nacional, dentro do prazo maximo de dous annos, a terminar no dia 31 de dezembro do seguinte áquelle em que deve começar a contagem do prazo de que trata o art. 3º. 1) para as obras de arte, litteratura ou sciencia, impressas, photographadas, lithographadas ou gravadas, de um exemplar em perfeito estado de conservação; 2) para as obras de pintura, esculptura, architectura, desenhos, esboços ou de outra natureza, um exemplar da respectiva photographia, perfeitamente nitida, tendo as dimensões minimas de 0m,18 X 0m,24.

     Art. 14. O direito de representação de uma obra litteraria é regulado conforme as disposições relativas ás obras musicaes.

     Art. 15. Toda execução ou representação publica total ou parcial de uma obra musical não póde ter logar sem consentimento do autor, quer ella seja gratuita, quer tenha um fim de beneficencia ou exploração. Todavia, si ella for publicada e posta á venda, considera-se que o autor consente na sua execução em todo o logar onde não se exija retribuição alguma.

     Art. 16. O direito de autor para as composições musicaes comprehende a faculdade exclusiva de fazer arranjos e variações sobre motivos da obra original.

     Art. 17. A cessão de um objecto de arte não implica a cessão do direito de reproducção em favor de quem o adquire, não podendo, porém, o artista reproduzil-o sem declaração de que não é o trabalho original.

     Art. 18. A reproducção de uma obra de arte por processos industriaes ou sua applicação á industria não lhe fazem perder o caracter artistico; mesmo nestes casos fica submettida ás disposições da presente lei.

     Art. 19. Todo o attentado doloso ou fraudulento contra os direitos de autor constitue o crime de contrafacção. Os que scientemente vendem, expoem á venda, teem em seus estabelecimentos para serem vendidos ou introduzem no territorio da Republica com fim commercial objectos contrafeitos, são culpados do mesmo crime.

     Art. 20. Nos crimes de contrafacção, os cumplices são punidos com penas iguaes ás dos autores.

     Art. 21. Consideram-se igualmente contrafacções:

     1) as traducções em lingua portugueza de obras estrangeiras, quando não autorisadas expressamente pelo autor e feitas por estrangeiros não domiciliados na Republica ou que nella não tenham sido impressas. As traducções autorisadas que estiverem nessas condições devem ter a menção expressa: «Traducção autorisada pelo autor», unicas que podem ser introduzidas, vendidas ou representadas no territorio da Republica;

     2) as reproducções, traducções, execuções ou representações, quer tenham sido autorisadas, quer o não tenham sido, por se tratar de obras que não gosam de protecção legal ou já cahidas no dominio publico, em que se fizerem alterações, accrescimos ou suppressões sem o formal consentimento do autor.

     Art. 22. Não se considera contrafacção:

     1) a reproducção de passagens ou pequenas partes de obras já publicadas, nem a inserção, mesmo integral, de pequenos escriptos no corpo de uma obra maior, comtanto que esta tenha caracter scientifico ou que seja uma compilação de escriptos de diversos escriptores, composta para uso da instrucção publica. Em caso algum a reproducção póde dar-se sem a citação da obra de onde é extrahida e do nome do autor;

     2) a reproducção, em diarios e periodicos, de noticias e artigos politicos extrahidos de outros diarios e periodicos e a reproducção de discursos pronunciados em reuniões publicas, qualquer que seja a sua natureza. Na transcripção de artigos deve haver a menção do jornal de onde são extrahidos e o nome do autor. O autor, porém, quer dos artigos, qualquer que seja a sua natureza, quer dos discursos, é o unico que os póde imprimir em separado;

     3) a reproducção de todos os actos officiaes da União, dos Estados ou das Municipalidades;

     4) a reproducção, em livros e jornaes, de passagens de uma obra qualquer com um fim critico ou de polemica;

     5) a reproducção, no corpo de um escripto, de obras de artes figurativas, comtanto que o escripto seja o principal e as figuras sirvam simplesmente para a explicação do texto, sendo, porém, obrigatoria a citação do nome do autor;

     6) a reproducção de obras de arte que se encontram nas ruas e praças;

     7) a reproducção de retratos ou bustos de encommenda particular, quando ella é feita pelo proprietario dos objectos encommendados.

     Art. 23. O crime de contrafacção será punido com as penas dos artigos respectivos do Codigo Penal, livro II, tit. XII, cap. V, secção 1ª, e com o confisco dos objectos contrafeitos e de todos os moldes, matrizes e quaesquer utensilios que tenham servido para a contrafacção, além da indemnisação de perdas e damnos causados ao autor da obra contrafeita. No Districto Federal observar-se-ha o seguinte:

      § 1º Essa indemnisação será demandada no fôro civil, haja ou não procedimento criminal e haja ou não condemnação do contrafactor. No caso de condemnação, o autor fica, porém, dispensado da prova de contrafacção e a acção civil se limitará á liquidação das perdas e damnos.

      § 2º A acção civil, seja qual for seu valor, será summaria.

     Art. 24. A applicação fraudulenta ou de má fé sobre uma obra litteraria, scientifica ou artistica, do nome de um autor ou de qualquer signal por elle adoptado para designar suas obras, será punida com a prisão cellular de seis mezes a um anno e multa de 500$ a 1:000$, sendo tambem a obra apprehendida.

     Art. 25. No caso de representação ou exhibição não autorisada de obras dramaticas ou musicaes, o autor ou concessionario poderá requerer a apprehensão das receitas brutas da representação ou exhibição e o emprezario reconhecido culpado será punido com prisão cellular por seis mezes a um anno. Paragrapho unico. A importancia da indemnisação de perdas e damnos não será nesse caso inferior a 50 % das receitas brutas.

     Art. 26. Salvo os casos do art. 22, n. 1, e do art. 24, em que deverá haver procedimento ex-officio da autoridade competente e em que qualquer, na falta desse procedimento, poderá intentar a acção criminal, só ao autor ou ao concessionario dos seus direitos incumbe a queixa e autoria do processo. Paragrapho unico. Qualquer dos collaboradores de uma obra artistica, litteraria ou scientifica póde, independente dos mais, usar do seu direito para punição dos culpados.

     Art. 27. O autor poderá iniciar o processo, requerendo busca e apprehensão dos objectos contrafeitos ou das pranchas, modelos e matrizes, que tenham servido para perpetração do delicto, o que será ordenado pelo juiz, mediante justificação judicial. Feita a apprehensão e si o autor decahir da acção, o réo terá direito de indemnisação de perdas e damnos.

     Art. 28. Revogam-se as disposições em contrario.

Capital Federal, 1 de agosto de 1898, 10º da Republica.

Prudente J. de Moraes Barros.
Amaro Cavalcanti.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Brasil de 1898


Publicação:
  • Coleção de Leis do Brasil - 1898, Página 4 Vol. 1 (Publicação Original)