Para especialistas, financiamento público corre risco

02/07/2007 - 17:27  

Depois de rejeitada a lista fechada para eleições proporcionais, a proposta da reforma política deverá preservar poucos pontos do Projeto de Lei 1210/07, que trata do assunto. Na opinião de cientistas políticos, temas como a fidelidade partidária e o fim das coligações para eleições de deputados e vereadores devem passar. Já o financiamento público exclusivo das campanhas estaria sob risco, inclusive para eleições majoritárias. O projeto está na pauta desta semana do Plenário.

Apesar da rejeição à adoção de listas fechadas para eleições proporcionais nas primeiras votações, o professor do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj) Jairo Nicolau considera que o fato de a reforma política estar sendo votada, por si só, representa um grande avanço. "É louvável que o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, e o deputado Ronaldo Caiado [DEM-GO, relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania] tenham abraçado a proposta e levado até o fim", disse.

Nicolau vê "algumas propostas interessantes" no projeto, que poderiam avançar de forma mais consensual, como a fidelidade partidária e o fim de coligações para eleições proporcionais, mas acrescenta ainda outra sugestão a ser incluída nos debates: a fiscalização seletiva da prestação de contas pelos tribunais regionais eleitorais e pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Segundo o professor, os tribunais eleitorais deveriam adotar sistema semelhante ao sorteio usado pela Controladoria-Geral da União (CGU) na avaliação dos gastos dos municípios. "Há milhões de dados para serem analisados, ninguém acredita que a fiscalização dos tribunais possa ser eficiente, mas, se o candidato souber que a campanha dele poderá ser investigada, com punições severas contra irregularidades, as regras serão muito mais respeitadas."

Lista
Jairo Nicolau considerou previsível a derrota da lista fechada, por ela representar o fim de um sistema "consolidado", que vigora há mais de 60 anos, e não oferecer garantias de que os atuais deputados seriam favorecidos por ela. "Muitos parlamentares que não são líderes partidários foram eleitos por redes fora da influência da legenda. Eles corriam altíssimo risco de ficar fora das listas", comentou.

O professor comparou a proposta com os sistemas que vigoram no mundo e declarou que não conhece exemplo de país que tenha trocado a lista aberta pela fechada. "Não conheço nada semelhante ao modelo rejeitado no Brasil. Na Suécia aconteceu o contrário [abriram a lista fechada] e a Itália passou da lista mista para a fechada", citou.

Consensos
O cientista político Lúcio Rennó, professor do Centro de Pesquisa e Pós Graduação sobre as Américas da Universidade de Brasília, considera que ainda faltam no Brasil os requisitos básicos para fazer a reforma política avançar. "Qualquer reforma institucional exige dois tipos de consenso: um empírico, sobre o quê há de errado; e outro normativo, relativo à eficiência do modelo proposto em substituição. Eles não existem no Brasil", comentou.

Além disso, Rennó identifica outro problema existente na discussão atual: a tendência de atribuir a alguns pontos da reforma política a solução para os escândalos de corrupção. "Isso ocorre especialmente em relação à proposta de financiamento exclusivamente público das campanhas e da percepção que os grandes escândalos estão relacionados ao caixa dois. Na verdade, para coibir a corrupção seria mais eficaz mudar o modelo de execução orçamentária, para torná-la impositiva", avaliou. Apesar da ressalva, ele acredita que o financiamento exclusivamente público não deverá avançar por causa da derrota da lista fechada.

Fidelidade
O cientista político acredita que a derrota da lista fechada não afetará a votação da fidelidade partidária, do fim das coligações para eleições majoritárias e da federação de partidos. Em relação à fidelidade partidária, ele vê interesse do próprio poder Executivo em aprová-la como uma forma de "restringir gastos" nas negociações com parlamentares. Os gastos, explica, são relacionados à liberação de recursos para emendas individuais. Com o apoio do partido ao governo, todos os seus integrantes deveriam seguir a orientação da legenda, reduzindo as brechas para negociações individuais.

Já o fim das coligações, para Rennó, "reduziria distorções" na representatividade de parlamentares que são eleitos sem alcançar quantidade de votos suficiente, mas são beneficiados pelo desempenho de outros concorrentes de sua coligação. "Como o coeficiente eleitoral é calculado pela coligação, e o eleitor não sabe quem participa dela, você pode votar em alguém de um partido e eleger candidatos de outro partido. O voto passa a ser quase uma roleta russa", definiu. O professor sugere o fim do coeficiente eleitoral, com a eleição apenas dos candidatos mais votados para as cadeiras disponíveis.

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Reportagem - Rodrigo Bittar
Edição - Regina Céli Assumpção

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