Direito e Justiça

Consolidação de leis do trabalho enfrenta resistências

03/04/2008 - 21:06  

A consolidação da legislação trabalhista despertou preocupações em autoridades que participaram, nesta quinta-feira, de seminário sobre o tema na Câmara. O ministro Maurício Godinho Delgado, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), afirmou que o processo, que não implica mudança de conteúdo das leis, mas apenas sua sistematização, será no máximo um jogo de soma zero. "Na melhor das hipóteses, será um empate", disse, dada a impossibilidade de inovação no mérito das leis.

A consolidação de leis deve reproduzir o conteúdo da legislação em vigor. Na norma consolidada, só se permite a concentração de várias leis em uma única, em que os conteúdos podem ser organizados por temas, por exemplo. O problema é que muitas das normas que foram reunidas no projeto de consolidação não são mais aplicadas pelos tribunais. Um dos argumentos é de que elas só tinham sentido na época em que foram publicadas — a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é de 1943 e foi alterada por várias leis desde o início de sua vigência.

Maurício Godinho Delgado advertiu que, se toda a legislação antiga for consolidada em uma nova lei, o argumento dos magistrados de que as leis não são válidas porque foram publicadas em outras épocas cairá por terra.

Ele citou, como exemplo de possível retrocesso, o revigoramento da Lei 4923/65, que admitia a redução dos salários em conjunturas econômicas desfavoráveis e que, segundo ele, "foi sepultada pelos tribunais". A Constituição determina que os salários só podem ser reduzidos por meio de convenção e acordo coletivo, com a participação dos sindicatos dos trabalhadores.

Delgado também criticou a inclusão dos dispositivos da CLT que prevêem que o banco de horas pode ser instituído por mero acordo escrito entre o empregado e o empregador, sem intervenção do sindicato. Para ele, a consolidação vai revitalizar a norma, que já estava sendo "enterrada" na jurisprudência trabalhista dominante. "Acordo entre empregado e empregador? Francamente", disse. "Os limites imperativos à duração da jornada vão desaparecer no projeto", acrescentou.

Outro ministro do TST, Lélio Bentes Correa, elogiou o esforço para consolidar a legislação trabalhista. Ele alertou, porém, que, diante do processo de consolidação — que envolve eliminação de ambigüidades, harmonização e atualização da linguagem —, o legislador terá de fazer escolhas. "É aí que reside o perigo", disse. Correa avalia que a consolidação não conta com o entusiasmo dos progressistas e, por implicar riscos de retrocesso, também não anima os que querem manter as coisas como estão.

Conveniência
Já o secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça, Rogério Favreto, questionou a conveniência do debate sobre a mera consolidação das leis. "Será que não estamos colocando de lado questões mais importantes, de fundo material?" indagou.

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, a consolidação é "inoportuna" porque, entre outras razões, nos termos propostos no Projeto de Lei 1987/07 transpõe para o presente uma "estrutura sindical arcaica", criada durante a ditadura de Getúlio Vargas para "amarrar os sindicatos".

"Se quisermos evoluir, precisaremos discutir uma reforma sindical para remover essas amarras", afirmou. Britto disse ainda que o projeto traz "um risco muito grande" porque coloca em uma eventual legislação nova "institutos ultrapassados".

O presidente da OAB acrescentou que a mudança da legislação trabalhista deve ser discutida com os principais interessados: os trabalhadores. Segundo ele, as normas em vigor resultam "das lutas, do sangue e do suor" dos trabalhadores e só podem ser alteradas mediante amplos debates.

Leia mais:
Deputado diz que consolidação será votada em 30 dias
Advogada defende revogação de artigos da CLT
Presidente eleito do STF apóia simplificação das leis

Notícias anteriores:
Câmara reinstala grupo de consolidação de leis

Reportagem – Edvaldo Fernandes
Edição – João Pitella Junior

(Reprodução autorizada desde que contenha a assinatura `Agência Câmara`)

Agência Câmara
Tel. (61) 3216.1851/3216.1852
Fax. (61) 3216.1856
E-mail:agencia@camara.gov.br

A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara Notícias'.