06/12/2018 17:45 - Saúde
Radioagência
Debatedores divergem sobre pesquisa clínica com seres humanos
O paciente que se submete a pesquisas com medicamentos novos - cerca de meio milhão de pessoas no Brasil - deve ou não ter o acesso gratuito a eles após a conclusão dos estudos? As normas atuais do Brasil obrigam que o patrocinador das pesquisas - governo ou empresas farmacêuticas - garanta o tratamento posterior. Apenas em caso de doenças raras, o período de gratuidade é limitado a cinco anos.
Parecer do relator do projeto (PL 7082/17) que regulamenta as pesquisas, deputado Hiran Gonçalves (PP-RR), quer limitar o tratamento posterior nos demais casos em dois anos após a conclusão do estudo. O relatório do deputado está sendo discutido na Comissão de Seguridade Social da Câmara, que fez audiência pública sobre o tema (6/12).
Hoje, a Conep, Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, e a Anvisa são responsáveis pela aprovação ou não de pesquisas clínicas no país. Solange Nappo, da Associação da Indústria Farmacêutica em Pesquisa, disse que o custo extra com os participantes faz com que as empresas prefiram fazer suas pesquisas em outros países:
"Quando o paciente de pesquisa recebe um medicamento da indústria, ele fica inteiramente ligado a ela. Ele deixa de fazer parte de qualquer sistema e ele passa a ser da indústria. A responsabilidade é dela, inclusive quando ele muda de cidade, tem que ter uma logística para saber onde ele está para doar o medicamento. Enfim, ele fica pendurado na indústria que até então não tinha esse papel e passa a ter agora."
Mas o coordenador da Conep, Jorge Venâncio, é contrário à mudança proposta pelo relator, porque entende que ela reduziria um direito atual do participante de pesquisas. Outra crítica de Jorge Venâncio é que o relatório estaria fazendo com que os patrocinadores decidam sobre questões médicas. Um exemplo seria o artigo que trata da decisão sobre o acesso dos participantes aos medicamentos após o fim da pesquisa; o que, segundo Venâncio, traria também a questão do conflito de interesses:
"Hoje como é isso? Quem avalia é o pesquisador ou o médico particular do participante de pesquisa. Então está se colocando essa atribuição para o patrocinador também. Para assumir inclusive uma responsabilidade que é de um profissional de saúde. E está se colocando a responsabilidade de profissional de saúde para o patrocinador também. Isso invade o terreno da própria profissão médica inclusive."
Para o coordenador da Conep, o relatório ainda vincula a comissão à estrutura ministerial. Segundo Venâncio, a vinculação atual ao Conselho Nacional de Saúde oferece mais independência aos pareceres.
Antoine Daher, presidente da Casa Hunter, que trabalha com pesquisas clínicas de doenças raras, disse que a estrutura atual não deve ser modificada porque a Conep tem conseguido emitir pareceres com menos de 30 dias. Ele ressaltou a necessidade de as decisões sobre os estudos serem ágeis. E citou as mudanças rápidas pelas quais o setor vem passando:
"Mapeamento de DNA, mapeamento neural, terapias celulares, terapia gênica (...) Esse é o futuro. O médico que não entende de genética daqui a dez anos talvez vá trabalhar de Uber (...). Então, se nós quisermos investir realmente em medicina de primeiro mundo, nós temos que investir nas novas tecnologias."
O vice-presidente da Comissão de Seguridade Social, deputado Odorico Monteiro (PSB-CE), disse que vai conversar com o relator em busca de um acordo sobre o texto. De qualquer forma, ele acredita que a regulamentação trará segurança jurídica para o setor, pois hoje as pesquisas são autorizadas com base em resoluções.