Política e Administração Pública

Ministros da Fazenda e da Agricultura dizem que não há fatos que justifiquem impeachment

Declarações foram feitas durante reunião da comissão do Senado que analisa o impeachment da presidente Dilma Rousseff

29/04/2016 - 20:36  

Agência Senado
ministros da Fazenda, Nelson Barbosa; da Agricultura, Kátia Abreu; e da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo em reunião da comissão do impeachment do Senado
Nelson Barbosa (E): mudança na meta fiscal de 2015, aprovada pelo Congresso, validou a edição de decretos pelo governo

Os ministros da Fazenda, Nelson Barbosa; da Agricultura, Kátia Abreu; e da Advocacia-Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, rechaçaram nesta sexta-feira (29) a existência de fatos que justifiquem o impeachment da presidente Dilma Rousseff pela prática de crime de responsabilidade.

Ao apresentarem as teses da defesa à comissão especial do impeachment no Senado, os ministros defenderam a legalidade dos atos praticados por Dilma Rousseff e apontaram supostas irregularidades no processo que pede o afastamento da presidente.

Para Cardozo, o impeachment de um presidente da República é uma situação "excepcionalíssima" que exige comprovação de falha grave e culpabilidade. “Para configuração do crime de reponsabilidade, tem que ficar configurado o dolo, a má fé da presidente. E onde está o dolo?”, perguntou aos senadores.

O ministro da AGU voltou a dizer que impeachment sem base jurídica constitui “golpe de Estado”. “Em se consumando um impeachment nesses moldes, efetivamente haverá um golpe”, disse Cardozo, sugerindo uma análise mais criteriosa dos senadores quanto à admissibilidade do pedido de afastamento da presidente.

Desvio de poder
Cardozo apontou vício de origem por desvio de poder do presidente de Câmara, Eduardo Cunha. Para o ministro, Cunha acolheu a denúncia contra Dilma Rousseff em retaliação ao fato de o Partido dos Trabalhadores (PT) ter declarado apoio à abertura do processo contra ele no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara.

Cunha é investigado por supostamente ter mentido à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras sobre a existência de contas no exterior. Ele nega ter cometido qualquer irregularidade.

“Ele [Cunha] claramente ameaçou o governo: ou me dão os votos ou abro o processo de impeachment. Essa ameaça e a chantagem qualificam a clássica figura de desvio de poder”, acusou Cardozo.

Sobre isso, o presidente da Câmara já respondeu que aceitou o pedido de impeachment de Dilma muito antes de o Conselho de Ética fazer qualquer deliberação a respeito do processo relativo a ele.

O ministro da AGU também criticou a Câmara porque, segundo ele, os partidos teriam obrigado seus deputados a votar em Plenário conforme a orientação dos líderes, sob pena de expulsão. Porém, houve deputados que avisaram, ao votar, que estavam contrariando a orientação dos seus partidos.

Pedaladas fiscais
Por sua vez, a ministra da Agricultura, Kátia Abreu, disse que os atrasos nos repasses do governo federal a bancos que operam programas sociais, chamados na denúncia de pedaladas fiscais, não podem ser considerados operações de crédito (empréstimo). A denúncia aprovada na Câmara dos Deputados considera crime de responsabilidade a União se valer de recursos próprios de bancos para o pagamento de subsídios (equalização de juros) a agricultores no âmbito do Plano Safra.

A ministra exemplificou que, para tomar dinheiro emprestado do banco público e plantar sua lavoura, o produtor paga entre 7,5% e 8,5% de juros, mas os juros cobrados pelo mercado estão próximos de 15%. “É essa diferença que quem paga aos bancos é o governo”, disse. Para a ministra, o atraso na equalização de juros não pode ser encarado como empréstimo por não existir, definido em lei, prazo para o pagamento.

O relator da comissão especial do impeachment, senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), questionou os ministros se os R$ 10,4 bilhões de equalização de taxas de juros do Plano Safra, em atraso, não configurariam financiamentos da União junto aos bancos. Em reposta, Kátia Abreu argumentou que apenas em outubro passado o Tribunal de Contas da União (TCU) obrigou o governo a pagar as subvenções em até cinco dias.

“Antes, não tinha prazo, desde que você terminasse o ano com a conta positiva com os bancos”, finalizou a ministra, acrescentando que as subvenções agrícolas são destinadas tanto à agricultura patronal como à agricultura familiar e promovem crescimento da produção e modernização do setor.

O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) discordou da tese da defesa. “Eu nunca vi banco prestar outro serviço que não seja emprestar dinheiro. O Banco do Brasil não presta serviço de jardinagem. Se ele presta serviço, é emprestando dinheiro”, disse.

Já o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) questionou a legitimidade do relator em analisar o impeachment. Segundo Farias, Anastasia também praticou pedaladas fiscais quando governou o estado de Minas Gerais. “O senhor acha justo tirar a presidente por um crime o senhor também cometeu?”, indagou.

A senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) também colocou em suspeição a relatoria do senador Anastasia. Segundo ela, quando governou Minas Gerais, Anastasia também praticou “pedaladas” e não cumpriu os percentuais mínimos constitucionais de investimento em saúde e educação no estado.

Em sua defesa, o relator disse que, à época, nenhum dos deputados da assembleia do estado pediu seu impeachment. Ele acusou a senadora de ter inveja dele por não ter sido eleita governadora no Paraná. “Se vossa excelência tem questionamentos, que os apresente à Justiça”, disse Anastasia.

Decretos
O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, concentrou-se na análise técnica da denúncia. Ele rebateu, por exemplo, a tese de que configura crime de responsabilidade a edição de decretos suplementares sem autorização do Legislativo e em desconformidade com um dispositivo da Lei Orçamentária.

Ao comparar os decretos a uma lista de compras de supermercado, Barbosa disse que não se trata de ampliar os itens da lista, mas sim de modificar quais itens seriam comprados com o mesmo valor.

“O orçamento é a lista de supermercado, e o limite financeiro é quanto você tem no bolso. Ao longo do processo, alguém diz que errou na lista e que, ao invés de comprar macarrão, você deve comprar manteiga. Você muda a lista, mas o valor que você pode usar continua sendo o mesmo. Mudar a lista não altera o valor que você tem para gastar”, exemplificou.

Barbosa sustentou ainda que a mudança na meta fiscal de 2015 aprovada pelo Congresso validou a edição desses dispositivos, usados pelo governo para remanejamento de recursos. “Os senhores parlamentares aprovaram a mudança na meta fiscal, que é anual e foi cumprida”, disse ele, criticando a aceitação do pedido de impeachment pelo presidente da Câmara no mesmo dia em que o Congresso aprovou a alteração da meta fiscal.

O ministro da Fazenda argumentou ainda que todos os seis decretos foram amparados por pareceres técnicos do Ministério da Fazenda, com base em remanejamento de recursos; excesso de arrecadação; e superavit financeiro (aumento de arrecadação em anos anteriores).

Relator da comissão, o senador Antonio Anastasia indagou o ministro da AGU se a presidente Dilma não reconhece que realizou as operações de crédito ou se não reconhece que as operações de crédito que realizou foram ilegais. Cardozo disse que o que a defesa entende é que a Lei de Responsabilidade Fiscal proíbe empréstimos, mas que o atraso no pagamento dos contratos feitos com os bancos não configurou empréstimo, uma vez que os atrasos nos repasses eram considerados regulares até mudança de entendimento do TCU em 2015.

“Esses contratos não configuram empréstimos. Atrasar serviço não é emprestar dinheiro. Nunca se vedou atrasos em pagamentos de prestação de serviços. Nesse caso, eu tenho uma situação de inadimplência e não uma operação de crédito”, disse Cardozo.

Reportagem – Murilo Souza
Edição – Pierre Triboli

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