Direitos Humanos

Criminalização e estigma dificultam dados precisos sobre mortalidade feminina causada por abortos, dizem debatedores

Insatisfeito com informações do Ministério da Saúde, autor do pedido para o debate na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, deputado Diego Garcia, quer CPI para investigar o número de mortes nesses casos

13/12/2017 - 22:11  

Debatedores afirmam que criminalização e estigma em torno do aborto dificultam a coleta de dados precisos sobre mortalidade feminina em decorrência desses procedimentos. A divergência de estatísticas sobre o tema foi debatida em audiência da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher nesta quarta-feira (13).

O deputado Diego Garcia (PHS-PR), um dos autores do requerimento para o debate, questionou números publicados pela imprensa: enquanto uma matéria cita quatro mortes de mulheres por dia em decorrência de complicações em abortos, outra cita 200 mil mortes por ano.

Antônio Augusto/Câmara dos Deputados
Audiência pública para a definição de critérios objetivos com vistas à reformulação da Lei nº 11.597, de 2007, que
Diego Garcia: divulgação de números "inflados" é estratégia dos que defendem legalização do aborto no Brasil

Em resposta a requerimento de informação (RIC 2.500/16) do deputado, o Ministério da Saúde admitiu que os números estavam equivocados. Para Diego Garcia, a divulgação de números "inflados" é estratégia dos que defendem a legalização do aborto no Brasil. Insatisfeito com as informações do ministério, o deputado iniciou a coleta de assinaturas para a instalação de CPI que investigue os reais números de aborto e de mortes maternas.

"Inclusive para investigar também os departamentos dentro do Ministério da Saúde, porque temos que saber quem é que está trabalhando lá, para quem está trabalhando e o que está fazendo. Eu não me contento com dados. Eu esperava que o Ministério da Saúde encaminhasse alguém que pudesse dar, além de dados, outras explicações mais claras. O aborto é crime, continua sendo crime e vamos colocar um ponto final nas mentiras e nas falácias que são publicadas pelos veículos de comunicação", declarou.

Diretora de vigilância e doenças do Ministério da Saúde, Fátima Marinho negou que os dados citados na imprensa tenham saído de seu órgão, que é responsável por essas estatísticas específicas. Segundo ela, os dados oficiais mais recentes estão prestes a ser publicados. Os números de 2015 mostram 211 mortes maternas por aborto.

Outros dados da pasta revelam pouco acesso das mulheres às possibilidades de aborto legal, em casos de estupro e gestação de anencéfalos, por exemplo. Entre 2011 e 2016, foram 4.262 casos de estupro em adolescente de 10 a 19 anos que resultaram em gestação e nascimento da criança. Para Fátima Marinho, as mortes estigmatizantes - como as causadas por aborto, aids e suicídio, por exemplo - são de difícil notificação.

"Mortes estigmatizantes são subnotificadas sempre em todos os países. As famílias não querem que apareça. Então, a gente fica entre o que é a estatística nua, crua e dura do número e o que é vida das pessoas e o direito à privacidade. Então, morte por aborto é estigmatizante e ela sempre vai ser subnotificada e a gente vai ter sempre que buscar essa informação sem dizer quem está morrendo", explicou.

Divergências
A audiência reuniu oito debatedores com posições divergentes. A presidente do Movimento Nacional da Cidadania pela Vida, Lenise Garcia, admite que a clandestinadade só permite estimativas em torno do aborto, o que, segundo ela, não justifica o fim da criminalização.

"É verdade que nós temos um problema de aborto clandestino. A solução tem que ser a prevenção. Então, temos, sim, um problema de saúde pública, mas a solução para esse problema não é, de forma alguma, a legalização do aborto", defendeu.

Já a advogada do Coletivo Margarida Alves, Mariana Prandini, frisou que as maiores vítimas da criminalização são as mulheres negras, pobres e das periferias, submetidas a mau atendimento nos serviços de saúde, discriminação social e prisão.

"Quando a gente pede a descriminalização do aborto, a gente pede uma política pública integrada que garanta educação sexual nas escolas; direitos reprodutivos para todas as pessoas; métodos contraceptivos efetivos, seguros e gratuitos; e planejamento familiar. Então, a pauta da descriminalização, na verdade, implica uma política pública ampla que vai nos permitir, então, acabar com a mortalidade materna", argumentou.

Por videoconferência, o presidente da comissão de pré-natal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, Olímpio de Moraes Filho, disse que a criminalização do aborto é reflexo de uma "sociedade patriarcal e machista, que não tem contato com a realidade". Ele ressaltou que não há punição para os homens e muitas abortantes poderiam estar vivas se tivessem nascido em países onde o aborto já está legalizado, como Uruguai, Portugal e Suíça.

Reportagem - José Carlos Oliveira
Edição - Geórgia Moraes

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