Direitos Humanos

Comissão pede providências do Executivo em favor dos guarani-kaiowá

31/10/2012 - 14:44  

Lúcio Bernardo JR
Coletiva em que Comissão de Direitos Humanos falará dos contatos com a ONU e a presidência da República para solucionar crise Guarani-Kaiowá - dep. Erika Kokay (Presidente em Exercício da CDHM)
Erika Kokay: o Estado deve indenizar os fazendeiros e entregar a posse das terras aos índios.

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara enviou nesta quarta-feira (31) uma carta à presidente da República, Dilma Rousseff, pedindo que o governo tome providências para resolver a situação dos índios da etnia guarani-kaiowá, ameaçados de despejo de parte de uma fazenda que ocupam no Mato Grosso do Sul.

Segundo a presidente em exercício do colegiado, deputada Erika Kokay (PT-DF), o Executivo deve indenizar os fazendeiros da região e entregar a posse da terra aos índios. “Muitos fazendeiros receberam de boa-fé propriedades em territórios indígenas, ainda que esses processos tenham sido irregulares. Portanto, cabe ao Estado brasileiro indenizar esses produtores, a fim de que não sejam prejudicados e deixem a região de maneira serena”, escreveram Erika e os deputados Domingos Dutra (PT-MA) e Padre Ton (PT-RO) na carta.

Uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região de ontem reverteu uma sentença de primeira instância que determinava a remoção dos índios da fazenda Cambará, no município de Iguatemi, a 462 quilômetros de Campo Grande. A decisão, no entanto, é provisória, e, segundo Erika, insuficiente: “O espaço destinado aos índios [um hectare] é muito pequeno e não resolve o problema de outras comunidades da região, que sofrem com dificuldades parecidas”.

Lúcio Bernardo JR
Coletiva em que Comissão de Direitos Humanos falará dos contatos com a ONU e a presidência da República para solucionar crise Guarani-Kaiowá - índio Eliseu Lopes Guarani
Lopes: líderes indígenas vêm sendo assassinados por empregados das fazendas.

A declaração da deputada foi feita durante coletiva de imprensa nesta manhã, da qual participou o líder indígena guarani-kaiowá Elizeu Lopes, que também reivindicou outras políticas públicas em favor da comunidade. “Estamos lutando há mais de 30 anos pelas nossas terras. A decisão [do TRF] é positiva, mas o resultado, insuficiente. São 170 pessoas para um pequeno espaço. Muitos de nós estão acampados nas estradas, as crianças tomam água suja enquanto o agronegócio aumenta a cada dia”, alertou.

Violência
Lopes também reclamou do aumento dos casos de violência contra os índios na região. Segundo ele, lideranças das comunidades vêm sendo assassinadas periodicamente por empregados das fazendas. O procurador da República em Dourados Marco Antonio Delfino de Almeida destacou o fato de que as comunidades não estão nem mesmo sendo atendidas pelos serviços de segurança pública locais. “Os índios ligam para o 190 e não são atendidos. A desculpa é que a responsabilidade seria da Polícia Federal. Isso é um caso claro de discriminação étnica”, afirmou.

Almeida também lembrou que as comunidades indígenas, que ocupam 0,1% do território do Mato Grosso do Sul, apresentam um dos piores índices de saúde e escolaridade do País. Para a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP), a situação dos índios no estado é “vergonhosa”: “É absolutamente humilhante eles viverem de cestas básicas, em uma terra totalmente devastada. A presidente da República tem autoridade para resolver e colocar um ponto final nisso”.

Casos de suicídio
Elizeu Lopes também comentou um suposta indício de suicídio coletivo dos 170 índios ameaçados de despejo. Segundo ele, o suicídio em massa não faz parte da cultura do seu povo.

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) já havia divulgado uma nota em que nega essa possibilidade. “O suicídio entre os guarani-kaiowá ocorre há tempos e acomete sobretudo os jovens. Entre 2000 e 2011, foram 555 casos motivados por situações de confinamento, falta de perspectiva, violência aguda e variada, afastamento das terras tradicionais e vida em acampamentos às margens de estradas. Nenhum dos referidos suicídios ocorreu em massa, de maneira coletiva, organizada e anunciada”, afirmaram os representantes do órgão.

Lúcio Bernardo JR
Coletiva em que Comissão de Direitos Humanos falará dos contatos com a ONU e a presidência da República para solucionar crise Guarani-Kaiowá - Monalisa Barros (representante do Conselho Federal de Psicologia(CFP))
Monalisa: assassinatos na região podem estar sendo encobertos pela hipótese de suicídio.

A diretora do Conselho Federal de Psicologia, Monalisa Barros, também levantou a possibilidade de que assassinatos na região estejam sendo encobertos pela hipótese de suicídio. “Essa é uma das possibilidades. Outra é que realmente a perda das estruturas de enfrentamento seja tão séria que, apesar de não fazer parte da cultura, eles estejam cometendo essa prática, tendo em vista a situação desumana em que vivem. Será preciso investigar”, disse.

Outros casos
Durante a entrevista coletiva, Delfino de Almeida alertou para outros dois pedidos de reintegração de posse na região, que podem terminar com o despejo de outras comunidades indígenas em Passo Piraju e em Nhu Verá, no município de Dourados.

No primeiro caso, uma decisão da Justiça já determinou a remoção dos índios, que vivem na aldeia há cerca de dez anos e contam com posto de saúde e escola instalados. O procurador contestou esse posicionamento. “Toda decisão tem de minimamente vislumbrar seus efeitos. O juiz no caso sequer mencionou a destinação de vários equipamentos públicos do território. Ou seja, a meu ver, quando a decisão foi proferida, o juiz sequer sabia o que lá havia”, declarou. O Ministério Público já anunciou que vai recorrer de todas as decisões contrárias aos índios na região.

Reportagem – Carolina Pompeu
Edição – Marcelo Oliveira

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