Política e Administração Pública

MPs se destacam como instrumento de preponderância do governo

09/03/2011 - 18:25  

Gilberto Nascimento
deputado Pauderney Avelino
Pauderney Avelino ressalta que o Legislativo acaba sendo pautado pelo Executivo.

As medidas provisórias representam um montante importante das propostas do Executivo analisadas na Câmara. Entre 1995 e 2006, elas reuniram 26% do grupo. Esse tipo de proposta oferece uma vantagem para o governo, já que tem eficácia imediata, desde sua apresentação. Ao contrário dos projetos de lei, portanto, as medidas provisórias já começam a gerar efeitos a partir do momento em que são assinadas.

Todas as vantagens ao Executivo associadas a esse tipo de proposta, segundo o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM), vêm estimulando o envio de MPs ao Congresso. Como elas têm prazo certo para deliberação na Câmara e no Senado (após 45 dias da publicação, a análise de todas as outras propostas fica suspensa), segundo o parlamentar, "o Legislativo acaba sendo pautado pelo Executivo".

Um exemplo disso diz respeito a um projeto de lei do próprio Avelino. Ele apresentou, em fevereiro deste ano, um projeto de lei que fixa o reajuste automático da tabela progressiva para cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (PL 177/11). O Executivo, contudo, deverá enviar ao Congresso neste mês uma medida provisória sobre o tema - que, provavelmente, terá tramitação priorizada. "Nós hoje só analisamos medidas provisórias, mas deveríamos ter uma pauta mínima da própria Câmara", defendeu Avelino, que é favorável à proposta do deputado Domingos Dutra (PT-MA) que altera o Regimento Interno da Câmara para determinar que no mínimo 30% das propostas incluídas na Ordem do DiaFase da sessão plenária destinada à discussão e à votação das propostas. Corresponde, também, à relação de assuntos a serem tratados em uma reunião legislativa. em cada sessão ordinária sejam de iniciativa de deputados (PRC 11/11).

Nova interpretação
Uma tentativa de liberar a pauta da Câmara foi feita em 2009 pelo então presidente, Michel Temer. Na época, passou-se a entender que o Plenário poderia votar, em sessões extraordinárias, propostas de emenda constitucional, projetos de lei complementar, resoluções e decretos legislativos, mesmo com a pauta das sessões ordinárias trancada por medidas provisórias, já que todos aquelas matérias tratam de temas que não podem ser objeto de MPs. Essa interpretação vale até hoje.

Em 2009, até 31 de dezembro, o Executivo editou 27 medidas provisórias, ao passo que, no ano passado, foram 42. Já a Câmara analisou 27 MPs em 2009 - reprovando apenas uma - e 22 em 2010, aprovando todas. Uma MP pode vir a ser votada somente no ano seguinte, e assim 11 entraram em 2011 trancando a pauta.

Prerrogativas maiores
O deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG) considera as MPs o maior exemplo de que o Executivo tem hoje prerrogativas bem maiores que as do Legislativo. "Esse instrumento é inédito na história republicana do País. Nem no governo militar o Executivo tinha um instrumento assim. As medidas provisórias interrompem o processo legislativo normal e, portanto, fragilizam a nossa democracia", disse Andrada.

Diógenis Santos
Mauricio Rands
Para Maurício Rands, hoje existe uma "hipertrofia do Executivo".

Para o deputado licenciado Maurício Rands (PT-PE), o sistema político atual provoca o que ele chama de "hipertrofia do Executivo". Segundo Rands, a medida provisória é sim um instrumento de preponderância do governo, mas não o único. O envio de projetos de lei com prazos curtos para deliberação e prioridade nas votações também prejudica o Legislativo, de acordo com o deputado. "O governo deveria aproveitar mais as propostas feitas pelos próprios parlamentares. Isso significaria respeitar nossa capacidade de interlocução", disse.

A prioridade dada à tramitação das propostas do governo, de acordo com Rands, pode até prejudicar as políticas públicas adotadas no País. "O Parlamento tem uma capilaridade que nem sempre o Executivo tem. O deputado, por exemplo, tem muito mais chance de conhecer a real necessidade de uma população do interior nordestino do que um burocrata do governo federal", argumentou.

As posições de Bonifácio de Andrada e Maurício Rands confirmam o resultado de pesquisa citada pelo cientista político José Álvaro Moisés, realizada pelo Instituto FSB Pesquisa, a pedido da revista Época, em 2009. Segundo o levantamento, dos 247 congressistas entrevistados, 81% consideram alta ou muito alta a limitação imposta pelas medidas provisórias para o pleno exercício de suas funções legislativas, e 93,5% deles também classificam como alta ou muito alta a influência do Executivo no desempenho do Congresso Nacional. "O problema gira em torno da qualidade da democracia. Somente as eleições não são suficientes. Quando as instituições políticas não funcionam de forma adequada, ou seja, quando o Parlamento tem pouca autonomia e não consegue definir sua própria agenda, há uma disfunção na democracia representativa", alertou Moisés.

Reportagem - Carolina Pompeu
Edição - Marcos Rossi

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