Direitos Humanos

Relatório da CPI da Violência contra Jovens Negros deve ser votado nesta quarta

Texto da deputada Rosangela Gomes ainda enfrenta resistência de integrantes do colegiado

14/07/2015 - 22:40  

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Violência contra Jovens Negros marcou uma reunião para esta quarta-feira (15), ao meio-dia, no plenário 14, a fim de votar o relatório final da deputada Rosangela Gomes (PRB-RJ). Nesta terça, o texto foi discutido por mais de quatro horas, mas não houve consenso para votação.

O parecer de Rosangela Gomes sugere a aprovação de 16 projetos de lei e 8 propostas de emenda à Constituição (PECs) que abordam mecanismos de combate à violência contra a juventude negra. Entre as propostas inéditas, está o Plano Nacional de Enfrentamento ao Homicídio de Jovens, que deve ser analisado por comissão especial, a partir de agosto, segundo o presidente da CPI, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).

Apesar de seu texto ter recebido diversas críticas, a relatora acredita que o colegiado conseguirá chegar a um acordo antes do desfecho dos trabalhos, no próximo dia 17. Ela observou que a divergência entre os parlamentares se concentra nas propostas para segurança pública, em especial a defesa do fim do auto de resistência (PL 4471/12) - registro pelo qual policiais justificam mortes ou ferimentos durante prisões ou perseguições de suspeitos.

“O relatório aponta dados do Mapa da Violência de 2014 como um grande indicador de que jovens são assassinados pelo enfrentamento com a força policial”, disse Rosangela. "Mas não temos homicídios por parte apenas da força policial, há também acidentes em razão de acidentes de trânsito, enfrentamento de gangues e suicídios”, ponderou.

Parcialidade
Na avaliação do deputado Delegado Edson Moreira (PTN-MG), o relatório da CPI é parcial. O texto, argumentou ele, falha ao enfatizar estudos que retratam a violência policial como causa única da mortalidade dos jovens negros e negligenciar outros aspectos sociais.

Reprodução/TV Câmara
dep. delegado Edson Moreira
Delegado Edson Moreira: relatório não ataca raízes da violência

“O Estado é o verdadeiro culpado, seja na forma de preparação das polícias, seja na falta de serviços, como creches, escolas, esporte e lazer”, disse Moreira, ressaltando a necessidade de aperfeiçoar a formação dos policiais, com aulas sobre racismo e direitos humanos.

O parlamentar também foi contrário à afirmação da relatora sobre a existência de genocídio de jovens negros no País. “Acredito em múltiplos homicídios, principalmente quando analisamos os dados do IBGE de que a população negra aproxima-se numericamente da branca. Não existe genocídio, mesmo que simbólico”, comentou. Conforme Moreira, nos locais do Brasil onde a população negra é majoritária, é evidente que o confronto com a polícia resultará em mais mortes entre negros.

Ainda na opinião do parlamentar, o relatório não ataca “as raízes” da violência, pois sugere apenas mudanças pontuais no sistema de segurança pública. “A violência está mais relacionada ao contexto social (ambientes familiares adoecidos e postos de trabalhos ruins) do que a etnia e raça em si”, opinou. Como soluções, ele propôs políticas de integração nos bairros de periferia, a ampliação de cursos técnicos para jovens e a criação de programa, vinculado ao Bolsa Família, de acompanhamento de adolescentes em situação de risco.

Competência judicial
Apesar de defender boa parte do relatório, o deputado Major Olimpio (PDT-SP) considerou “absolutamente impróprio” o deslocamento, proposto por Rosangela Gomes, da competência judicial estadual para a Justiça Federal no julgamento de casos de violação de direitos humanos. “Estão criando uma mentalidade discriminatória de que o federal é melhor que o estadual, e o estadual é melhor do que o municipal.”

Ele também criticou a proposta que acaba com o auto de resistência. “O sistema policial não é o principal ator nesta guerra civil existente no Brasil, pois o pior quadro de confronto policial tem gerado um índice não superior a 4% dessas mortes [jovens negros], sem analisar caso a caso”, afirmou. Ele defendeu uma polícia cidadã, com mais recursos e melhor capacitação.

O parlamentar apresentou voto em separado ao parecer, justamente para suprimir as duas determinações (mudança da competência judicial e fim dos autos de resistência).

Racismo midiático

Lucio Bernardo Jr./Câmara dos Deputados
Erika Kokay
Erika Kokay: texto dá visibilidade ao racismo, que ainda é visto como tabu no País
Já para a deputada Erika Kokay (PT-DF), as sugestões da relatora são positivas. Em sua opinião, o texto dá visibilidade ao racismo, que ainda é visto como tabu no País. Kokay se mostrou preocupada com o “racismo midiático, que legitima a invisibilidade da população negra nos meios de comunicação de massa” e propôs à relatora políticas de inclusão social nesse sentido.

Nesse ponto, Kokay foi apoiada pela deputada Benedita da Silva (PT-RJ): “As pessoas não devem ser estereotipadas e violentadas. Isso precisa ficar transparente nas sugestões da CPI”. Conforme Benedita, ainda prevalece a visão de que cabe ao ator negro interpretar a personagem que usa o idioma de forma errada ou trabalha como empregada doméstica.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), por sua vez, acredita que o relatório subsidia novas políticas de segurança pública para coibir a violência baseada na raça. Uma das iniciativas do relatório da CPI destacada por ele é o apoio à criação de polícias estaduais únicas, desmilitarizadas e de ciclo completo, como estabelece a PEC 423/14.

Reportagem – Emanuelle Brasil
Edição – Marcelo Oliveira

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