Política e Administração Pública

Relator: juro alto é responsável por escalada da dívida pública

27/04/2010 - 22:32  

Laycer Tomaz
Pedro Novais: custos da política monetária prejudicam o País.

A política econômica de juros altos é a principal responsável pelo crescimento da dívida públicaDívida contraída pelo governo para financiar gastos não cobertos pela arrecadação de impostos e para alcançar objetivos da política econômica, como controlar o nível de atividade, crédito, consumo ou captar dólares no exterior. A dívida pública pode ser interna ou externa.  brasileira. Essa é a conclusão do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Dívida Pública proposto pelo deputado Pedro Novais (PMDB-MA), e que deve ser votado daqui a duas semanas. Ele concluiu nesta terça-feira a leitura do seu parecer, mas adiantou que quer discutir o texto com os integrantes da CPI antes da votação.

Novais defende que a troca de uma dívida externa, atrelada ao dólar, por uma dívida interna, atrelada à taxa SelicÉ considerada a taxa básica de juros da economia, por ser usada em operações entre bancos e ter influência sobre os juros de toda a economia. A taxa brasileira é uma das mais altas do planeta, atraindo para o mercado financeiro o dinheiro que poderia ser investido em atividade produtiva. É definida mensalmente pelo Banco Central. Selic é a sigla para Sistema Especial de Liquidação e Custódia, criado em 1979 pelo Banco Central e pela Andima (Associação Nacional das Instituições do Mercado Aberto) com o objetivo de tornar mais transparente e segura a negociação de títulos públicos. O Selic é um sistema eletrônico que permite a atualização diária das posições das instituições financeiras, assegurando maior controle sobre as reservas bancárias. Hoje, Selic identifica também a taxa de juros que reflete a média de remuneração dos títulos federais negociados com os bancos. Cerca de metade da dívida pública está atrelada à Selic. Essa é a parcela da dívida chamada de pós-fixada., pode não ser tão positiva como diz o governo. Para ele, o aumento da dívida vem dessa decisão, que protege o País das crises externas, mas cria uma condição muito boa para os credores do Brasil, que tem uma cultura de juros altos.

Outro problema apontado pelo relator é o alto custo da manutenção de reservas internacionais pelo governo. Enquanto títulos brasileiros da dívida pagam a Selic, atualmente em 8,75% e prestes a aumentar, a maioria das reservas brasileiras é aplicada em títulos da dívida pública norte-americana (US treasury bonds) — escolha de menor risco, cujo retorno por ano é de 0,5%. "A discrepância entre juros recebidos e pagos aumenta os custos da política monetária, o que é prejudicial ao País", disse.

Previdência
Para o deputado Ivan Valente (Psol-SP), que propôs a instalação da CPI, essa é uma conclusão positiva. Ainda que o relator não tenha dito isso, Valente ressalta que pelo menos tacitamente o texto reconhece que o crescimento da dívida não foi causado pelos gastos com Previdência ou com o pagamento de servidores, como é defendido por setores da área econômica do governo e da oposição. "Nossas constatações são quase as mesmas: o diagnóstico é de que há problemas na dívida, mas as recomendações do relator não resolverão o problema", disse.

A principal discordância de Valente é quanto a uma auditoria minuciosa da dívida, para rever a forma como ela foi contraída e como aumentou nos últimos anos. Para o deputado, deveria ser aberta uma auditoria externa, como foi previsto pela Constituição de 1988. Já o relator recomenda que essa fiscalização continue sendo feita pelo Congresso, com ajuda do Tribunal de Contas da União (TCUÓrgão auxiliar do Congresso Nacional que tem por atribuição o controle externo dos atos financeiros, orçamentários, contábeis, operacionais e patrimoniais dos Poderes da República. ).

Indiciamentos
Embora afirme que é possível melhorar a administração da dívida pública, o relator ressalta que a comissão não encontrou indícios de ilegalidades nos processos de contratação e renegociação. Segundo ele, representantes do TCU disseram desconhecer qualquer comportamento suspeito de agentes públicos na administração da dívida. "Aqueles que levantaram críticas ao processo de endividamento e aos termos das renegociações não ofereceram, à CPI, elementos que fundamentassem acusações concretas contra procedimentos ou pessoas", disse Novais.

O deputado Ivan Valente, no entanto, contestou essa informação e disse que os representantes do TCU ouvidos fizeram estudos pontuais e limitados e, mesmo assim, encontraram irregularidades. Segundo ele, o Ministério Público deveria ser acionado para investigar todos os indícios citados na CPI por depoentes. Valente já adiantou que pretende propor um voto alternativo ao do relator, devido a esses pontos.

Beneficiários
Para o deputado Paulo Rubem Santiago (PDT-PE), a principal incógnita continua sendo a identificação dos beneficiários dos pagamentos feitos pelo Brasil quanto a juros, amortização e renegociação da dívida. Para ele, o mercado financeiro sustenta uma política de juros altos no Brasil, por meio de sua influência sobre o Banco Central, e os bancos são os principais beneficiados pelos papéis da dívida brasileira, que rendem juros altos.

Já para Pedro Novais, o fato de a dívida estar nas mãos de bancos não quer dizer que o sistema financeiro a controle. Os papéis, segundo o seu relatório, estão lastreando fundos de renda. Pelos dados da Secretaria do Tesouro Nacional, bancos nacionais detêm hoje 27% da dívida pública mobiliária federal, enquanto os bancos estrangeiros tem participação de 6%. "Sabemos que hoje, embora boa parte dos títulos esteja em carteira de bancos, eles detêm os títulos em nome de um segmento de poupadores que aplica em investimentos (CDBs, por exemplo) lastreados nesses títulos", explicou.

Reportagem - Marcello Larcher
Edição – João Pitella Junior

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