Seminário debate abusos em atos de interdição judicial

20/10/2005 - 21:22  

Seminário nacional discute na Câmara o controle das interdições judiciais no Brasil, a luta pela cidadania dos portadores de transtornos mentais e a concessão do Benefício de Prestação Continuada previsto na Lei Orgânica da Assistência Social. Para terem direito a esse benefício, muitos pacientes optam por abrir mão de sua cidadania.
O encontro começou nesta quinta-feira e prossegue até sexta. É organizado pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em parceria com a Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial.

Contra excessos
Segundo a presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputada Iriny Lopes (PT-ES), é preciso verificar se há banalização da interdição judicial e buscar a modernização da legislação vigente para evitar eventuais excessos. "O exagero nas interdições em pacientes psiquiátricos está na contramão do movimento de reforma psiquiátrica, que busca a reinserção do doente mental na sociedade. A interdição retira a cidadania dessas pessoas", avaliou a deputada.

Sem cidadania
Durante o seminário, foi lançada a publicação "Novo Direito dos Portadores de Transtorno Mental - medidas de segurança e interdição judicial", elaborada pelo vice-presidente do Conselho Federal de Psicologia, Marcus Vinícius de Oliveira. Segundo ele, o assunto envolve mais de 30 mil brasileiros portadores de transtorno mental, que recorrem à interdição para comprovar a incapacidade para o trabalho e, assim, receber os benefícios sociais.
"Trata-se de um erro essa prática que está acontecendo dentro do Estado brasileiro. Ela tende a produzir um grupo de brasileiros sem nenhum direito de cidadania. São pessoas tratadas como se fossem crianças - não podem votar, casar, comprar a prestação..."

Mudanças
Marcus Vinícius afirma que diversas normas devem mudar, como as regras para a concessão do Benefício de Prestação Continuada e os critérios utilizados pelos peritos para julgar a incapacidade. Ele também propõe que os juízes sejam mais criteriosos em relação à interdição. Defende ainda que o Ministério Público fiscalize melhor as concessões e que as entidades de direitos humanos continuem sua luta para reverter essa situação.
Representante da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Niusarete de Lima afirmou ser importante verificar se os processos de interdição estão acontecendo devido à fragilidade de outros programas do governo. Nesse caso, disse, é preciso corrigir as falhas para que as políticas públicas se fortaleçam.
"Existe uma constatação pelo próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) do aumento das interdições nos últimos anos. Nós temos que descobrir por que isso está acontecendo: se é por alguma falha na saúde pública ou se é porque as pessoas, por não conhecerem o que representa um ato de interdição, interditam o filho como forma de receber um salário-benefício para a sobrevivência", afirmou Niusarete.
O professor de Direito Constitucional da Universidade de Brasília (UnB) Melick de Carvalho defendeu a ressocialização dos portadores de transtorno mental, em vez do isolamento.

Perseguição política
Já o professor da UnB José Geraldo de Sousa Júnior citou a utilização da interdição judicial por regimes totalitários como forma de expurgar adversários políticos. Na antiga União Soviética, disse ele, era comum o uso desse recurso.
Sousa Júnior relatou a história de um camponês paranaense chamado Galdino, que ficou oito anos internado em um manicômio, na década de 70, por ter liderado protesto contra a construção da hidrelétrica de Itaipu - concluída em 1974. A internação era sempre renovada pois, segundo os laudos médicos, permaneciam inalteradas as condições que a determinaram. Ou seja, Galdino continuava contrário à obra dos militares. O governo da época, disse o professor, apoiava-se na idéia de que a resistência era um ato que justificava a internação em manicômio e, por conseqüência, a interdição judicial.

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Reportagem - Simone Salles e Oscar Telles
Edição - Sandra Crespo

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