Política e Administração Pública

Demora em julgamentos pode anular eleição de candidatos ficha limpa

Se houver atraso, as decisões judiciais sobre candidatos ficha suja poderão ter impacto no quociente eleitoral das eleições para deputados. A maioria dos candidatos depende do quociente para se eleger.

18/08/2010 - 15:08  

Um eventual atraso na definição de como se dará a aplicação da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10) nas eleições deste ano poderá anular até mesmo a eleição de candidatos que cumprirem todas as exigências legais.

Ontem, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu que a Lei da Ficha Limpa tem validade para este ano, mas dezenas de recursos aguardam julgamento. O debate sobre o tema ainda deve seguir para o Supremo Tribunal Federal (STF). Assim, os julgamentos poderão terminar só depois da posse dos deputados.

Os problemas causados por um julgamento tardio se manifestarão especialmente no pleito para a vaga de deputado, uma vez que poucos candidatos conseguem alcançar o quociente eleitoral por conta própria. (Entenda o cálculo do quociente eleitoral).

Assim, a maioria será eleita a partir de votos obtidos por outros candidatos. Se esse votos forem anulados - com a perda de mandato de um eleito “ficha suja” -, haverá boas chances de mudarem outros eleitos.

Quociente eleitoral
Nas eleições de 2006, apenas 32 candidatos a deputado federal obtiveram o quociente eleitoral necessário para conseguir uma cadeira na Câmara. Os outros 481 eleitos precisaram dos votos dados a outros candidatos.

A maior votação recebida em termos absolutos foi a do deputado Paulo Maluf (PP-SP), que recebeu 739.827 votos em 2006. Como o quociente eleitoral em São Paulo foi de 295.882, os votos de Maluf foram suficientes para eleger pelo menos mais um candidato de sua coligação.

Em termos proporcionais, o recordista no último pleito foi o deputado Ciro Gomes (PSB-CE), que obteve 667.830 votos, suficientes para eleger pelo menos outros dois candidatos.

Emanuel Campelo Pereira, advogado eleitoral, explica, em entrevista à TV Câmara, as possíveis consequências nas eleições do atraso dos julgamentos de candidatos

Consequências da cassação
Se um candidato for cassado após sua posse na Câmara e isso implicar a troca de outros eleitos, com mudança no tamanho das bancadas partidárias, poderá haver reflexos no trabalho geral do Legislativo. Muitas das atividades da Câmara se submetem ao tamanho das bancadas, entre elas: a composição e a presidência das comissões permanentes, a composição da Mesa Diretora da Casa, o direito a representação partidária formal, o tempo para discurso de líderes em plenário e o número de funcionários destinados ao partido.

Em relação aos cargos majoritários, o impacto da cassação dependerá do momento em que ela ocorrer e do cargo em questão. No caso dos governadores, o presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais, Marlon Jacinto Reis, afirma que será necessária a realização de uma nova eleição ou, no caso de a cassação ocorrer após dois anos da posse, o novo ocupante do cargo será escolhido de maneira indireta.

No caso dos senadores, se o primeiro colocado obtiver mais de 50% dos votos e for cassado, deverá haver uma nova eleição. Caso sua votação seja menor, assumirá o primeiro da lista de votados que não foi eleito.

Responsabilidade do candidato
Para o cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) Octaciano Nogueira, a indefinição sobre a Lei Ficha Limpa é fruto do atraso na votação do projeto no Congresso. “Embora a eleição tenha data fixada, ela só termina muito depois, com o julgamento dessas questões. Lamentavelmente, isso tudo faz parte da cultura política brasileira”, acrescentou.

Já o presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais, Marlon Jacinto Reis, acredita que o STF não deve se apressar em seu julgamento. Para ele, cabe ao candidato ficha suja responsabilizar-se por afetar sua legenda e, aos eleitores, a responsabilidade de conhecer a ficha dos candidatos antes de votar.

“Os candidatos que disputam as eleições à base de liminares têm que lembrar que podem afetar sua legenda. Mas o mais importante é que o Supremo decida sem açodamento, pois ele não é um tribunal eleitoral e sua posição vai estabelecer o destino da democracia brasileira”, declarou.

Para Reis, não haverá problema se a decisão do STF for anunciada depois das eleições, especialmente porque os candidatos lançaram suas campanhas sabendo que poderiam ser barrados pela lei. “É um preço político que os partidos vão pagar por um jogo em que entraram de forma consciente; eles participam dele por conta e risco, já que estão se confrontando com a lei”.

O registro de candidatos com base em liminares ocorreu mesmo depois de a maioria dos partidos políticos ter afirmado que vetaria essas candidaturas.

Reportagem – Rodrigo Bittar
Edição - Pierre Triboli

A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara Notícias'.