Direitos Humanos

OAB questionará no STF prescrição de crimes de tortura

16/10/2008 - 15:24  

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) deve entrar na próxima semana, no Supremo Tribunal Federal (STF), com uma ação para que o tribunal decida se a legislação brasileira de anistia beneficia ou não as pessoas - civis e militares - que praticaram crimes de tortura durante a ditadura militar (1964-1985). Segundo o presidente da OAB, Cezar Britto, caberá ao Supremo decidir se crimes desse tipo praticados há mais de 20 anos prescrevem ou não. "Se o Brasil assinou tratados internacionais que prevêem a imprescritibilidade da tortura, seria lógico que o STF dissesse que tortura não prescreve", afirmou Britto nesta quinta-feira.

O presidente da OAB participou na Câmara do 2º Seminário Latino-Americano de Anistia e Direitos Humanos, promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias em parceria com entidades de anistiados de todo o País. Um dos temas discutido na manhã desta quinta-feira foi a imprescritibilidade dos crimes de tortura e a responsabilização de agentes públicos que violaram direitos humanos durante a ditadura.

A imprescritibilidade foi defendida também pela procuradora da República em São Paulo Eugênia Fávero. "Pela lei brasileira, os crimes prescrevem em 20 anos, mas esse crime do governo contra a população civil é diferente e deve ser repudiado por toda a humanidade. Eles têm de ser punidos mesmo que a lei interna favoreça os criminosos", afirmou Eugênia.

A procuradora considera que não é tarde para punir. "Os torturadores não morreram. Há muitos delegados que torturavam, encapuzados", afirmou. Cezar Britto também acredita que as pessoas autoritárias continuam no poder.

Países vizinhos
Tanto Eugênia Fávero quanto Cezar Britto lamentaram que o Brasil não conheça toda a verdade sobre a ditadura, uma vez que as ações de anistia têm se limitado a indenizações, ficando de lado a punição de responsáveis. Britto lembrou que países vizinhos também discutem o assunto e alguns, como a Argentina, puniram culpados.

De fato, como informou no seminário o presidente da Câmara Nacional de Apelações no Tribunal Criminal de Buenos Aires, Eduardo Freiler, a Argentina prendeu todos os comandantes de sua ditadura (1976-1983). Depois de muitas idas e vindas na legislação, em que militares foram julgados ou receberam indulto, finalmente em 2001 foram presos todos os comandantes vivos que atuaram na ditadura. "Esses avanços não teriam ocorrido se não houvesse um forte compromisso das organizações de direitos humanos na Argentina, entre elas as Mães da Praça de Maio", afirmou Freiler.

Na opinião da procuradora Eugênia, a Argentina compreendeu e aceitou o conceito de crime contra a humanidade, o que ainda não ocorreu no Brasil. Fazendo suposições, ela disse temer que juízes argentinos julguem criminosos brasileiros ou que o Brasil passe a receber criminosos argentinos, "porque aqui há refúgio para eles".

Já na Venezuela, a imprescritibilidade de crimes contra os direitos humanos está prevista na Constituição, conforme informou a promotora de Justiça do Ministério Público venezuelano Teolinda Ramos. Ainda segundo a Constituição venezuelana, as pessoas responsáveis por esses delitos não têm direito a anistia ou indulto. Além disso, duas leis de anistia editadas nos últimos oito anos excluem esses crimes de qualquer tipo de anistia, cumprindo a Constituição.

Lentidão
No seminário, os deputados Chico Lopes (PCdoB-CE) e Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) reclamaram da lentidão brasileira no julgamento de processos de anistia. "Não somos mais tão jovens para esperar a boa vontade de qualquer comissão. Queremos ser anistiados pela lei e também a punição dos torturadores", afirmou Chico Lopes, ele próprio um anistiado. Já Arnaldo Faria de Sá sugeriu que o assunto fosse levado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Se ele [Lula] está lá, é por causa da anistia."

Também foram abordados no encontro assuntos como a importância da cultura nas democracias e os fatos históricos que levaram à instalação de ditaduras na América Latina. O seminário será encerrado nesta quinta-feira.

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Reportagem - Noéli Nobre
Edição - Regina Céli Assumpção

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