Candidatos com ficha suja: deputados divergem sobre rigor de normas

03/10/2008 - 09:00  

O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) intensificou nos últimos dias a coleta de assinaturas para seu o anteprojeto de lei de iniciativa popular que será enviado à Câmara e que proíbe pessoas condenadas em primeira instância de se candidatarem a cargos eletivos. O objetivo é garantir as 1,3 milhão de assinaturas necessárias para que o texto possa ser apresentado aos deputados até dezembro. Já foram colhidas 350 mil desde 1º de setembro. Neste domingo (5), com a realização do primeiro turno das eleições municipais, haverá postos de coleta de assinaturas do lado de fora das seções eleitorais, encerrando a 2ª Mobilização Nacional da Campanha Ficha Limpa.

O anteprojeto é a principal iniciativa da campanha do MCCE, que engloba 37 entidades da sociedade civil. O texto veda a candidatura de pessoas condenadas em primeira instância - ou seja, sem decisão definitiva - por crimes como homicídio doloso, racismo, estupro, lavagem de dinheiro, uso de mão-de-obra escrava e desvio de verbas públicas, além dos já previstos na Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar 64/90).

Ele também amplia o tempo de inelegibilidade para oito anos, em vez dos três atuais, para todos os políticos que tiverem as contas rejeitadas e para os que foram cassados. Atualmente, só ficam inelegíveis por oito anos os deputados, senadores e vereadores cassados.

Reação
Pelo fato de ter respaldo popular, o texto deverá receber atenção especial dos deputados. Além disso, como virá na forma de projeto de lei complementar, terá tramitação prioritária.

Antes mesmo da sua vinda, porém, o anteprojeto já provoca reações na Câmara. Apesar de reconhecerem que o momento é propício para a discussão do assunto, os deputados se preocupam com a inelegibilidade de candidato condenado somente em primeira instância.

Para alguns parlamentares, isso pode trazer insegurança jurídica ao processo eleitoral e prejudicar pessoas injustamente condenadas em primeira instância. "Primeira instância, acho muito arriscado. É melhor esperar a confirmação da segunda instância", avalia o jurista e deputado Regis de Oliveira (PSC-SP), relator do projeto da reforma política debatido neste ano na Câmara (PL 1210/07).

Regis de Oliveira reconhece que há uma pressão popular para que pessoas com condenação judicial não concorram a cargos eletivos. Ele lembra, porém, que a Constituição garante a todos a presunção da inocência. Por isso, ele acredita que o anteprojeto deve ser alterado na Câmara.

Constituição
O deputado Gerson Peres (PP-PA) vai mais longe e defende mudanças também no texto constitucional. Ele salienta que a Constituição só autoriza a cassação de direito político depois de condenação transitada em julgado (quando não pode mais haver recurso). "Primeiro temos que mudar a Constituição. E é melhor deixar a condenação em segunda instância, pois em política há muita indignidade processual", disse Peres, referindo-se à possibilidade de decisões judiciais basearem-se em motivações políticas, e não legais.

Um dos principais conhecedores da legislação eleitoral na Câmara, Peres faz ainda uma ressalva: é preciso que o Judiciário torne-se mais ágil no julgamento de processos com políticos. Ele defende até a criação de varas específicas para julgar ações envolvendo possíveis candidatos. "A própria Justiça tem parte da culpa nessa história de candidato com fichas sujas, pois demora a julgar os processos", afirmou.

Para o ministro-substituto do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Henrique Neves, o texto de iniciativa popular deveria estar focado na condenação em segunda instância, que reforçaria a culpa do réu. Além disso, ele defende que apenas alguns tipos de crimes sejam causas de inelegibilidade, "principalmente os de maior poder ofensivo, como homicídio, que não são resolvidos em juizados especiais".

* Matéria atualizada às 16h39

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Reportagem - Janary Júnior
Edição - Marcos Rossi

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