Comissão quer evitar processo de mulheres que abortaram

30/04/2008 - 19:47  

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias divulgou hoje nota oficial em que pede a reconsideração do pedido de indiciamento de 9.896 mulheres pela prática de crime de aborto em Campo Grande. A decisão foi tomada pelo juiz da 2ª Vara do Tribunal do Júri do Mato Grosso do Sul, Aloísio Pereira dos Santos, atendendo a pedido do promotor estadual de Justiça Paulo César dos Passos. Segundo o juiz, os abortos foram realizados entre 1º de agosto de 1999 e 2001.

As mulheres são acusadas em inquérito, instaurado em abril do ano passado, contra a médica Neide Mota Machado. Ela era proprietária da Clínica de Planejamento Familiar, em Campo Grande, que, conforme denúncia do Ministério Público Estadual, realizou milhares de abortos durante 20 anos.

O juiz determinou que as mulheres sejam interrogadas e, se culpadas, indiciadas. Ele pediu pressa nos procedimentos para evitar a prescrição do delito, que ocorre em oito anos.

Aberração jurídica
O presidente da comissão, deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), considera a hipótese de condenação coletiva profundamente injusta. "Se consideramos que essas mulheres não engravidaram sozinhas, por que apenas elas foram arroladas no processo?", questionou. O parlamentar aponta um caráter "flagrantemente discriminatório" na decisão, que na sua opinião "criminaliza o gênero, e não as pessoas".

O possível indiciamento dessas 10 mil mulheres representa cerca de 40% de toda a população feminina cumprindo pena em todo o território nacional (25 mil detentas). "Nem mesmo nos anos de ditadura militar o Brasil registrou ação penal dirigida dessa magnitude", revolta-se Mattos. "Onde obter celas ou mesmo entidades preparadas para prestação de penas alternativas para tal contingente?"

O indiciamento e processamento judicial coletivo, sem o necessário exame das razões e características de cada um dos milhares de casos, é entendido como uma "aberração jurídica" para o deputado. Ele ainda avalia que a decisão é inoportuna, já que o tema da descriminalização do aborto está em discussão na sociedade e no Congresso Nacional.

Punição ineficaz
O parlamentar aponta a ineficácia de criminalizar o aborto para impedir sua prática. Atualmente, a legislação o permite apenas em casos de gravidez decorrente de estupro ou com risco de vida para a mãe. Por causa da proibição em outras situações, estima-se que 1,5 milhão de procedimentos são realizados a cada ano de forma insegura.

Mattos conclamou os parlamentares a revisar a legislação punitiva para que ela esteja em conformidade com os princípios constitucionais da dignidade, autonomia e direito à saúde reprodutiva das mulheres. "A prática do aborto deve ser examinada à luz dos princípios constitucionais e do bom senso, no âmbito das políticas de saúde pública e de cidadania", entende.

O Brasil já assumiu compromissos internacionais de revisar a legislação que criminaliza o aborto, a exemplo da Declaração da Conferência do Cairo (1994), da Plataforma de Pequim (1995) e da Convenção de Belém do Pará (1995). Em âmbito nacional, essa revisão também é uma das políticas aprovadas na 1ª e na 2ª Conferência de Política para as Mulheres, realizadas em 2004 e 2007.

Agenda
O presidente da comissão vai reunir-se na próxima terça-feira (6) com a ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéia Freire. O encontro deve tratar de temas relacionados à agenda social de gênero, incluindo as propostas em tramitação no Congresso.

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Da Redação/FB

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